Pular para o conteúdo principal

Há quantos anos se ensina danças de par no Brasil? Saiba aqui


Primeiramente, vamos lembrar que dança de salão é só mais uma forma de dança de par, só que caracterizada pela aproximação de corpos, pela existência de uma condução mínima do cavalheiro em relação à dama, e pelo respeito a certas normas básicas de conduta, dentro de um ambiente fechado por quatro paredes, que se convencionou chamar de "salão".

Em assim sendo, podemos imaginar que já existissem muitas danças de par no Brasil-Colônia, principalmente as trazidas pelos colonizadores, que dariam origem às nossas danças folclóricas.  Mais tarde também os escravos africanos vieram dar sua contribuição, originando uma dança de par chamada Lundu, muito popular até o século 19.  Mas, e quanto à dança descrita no primeiro parágrafo acima, conduzida, com regras de conduta, dentro dos salões?  Quando terá surgido no Brasil?  E quais teriam sido os primeiros "professores" desse tipo de dança?

Lundu, em gravura de Rugendas
Não vamos afirmar que antes da chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil, em 1808, não houvesse ensino de dança de salão no Brasil.  Afinal, dançar socialmente fazia parte das regras de etiqueta da nobreza e das classes abastadas europeias, e muitas famílias brasileiras mais abonadas costumavam mandar seus jovens para colégios em Portugal, França e Inglaterra, principalmente.  Então, como garantir que, ao regressarem, não tenham vindo com noções de dança social, como era chamada esse tipo de dança na época?  Como garantir que alguns desses jovens não tenham passado adiante esse conhecimento e praticado em saraus e comemorações? Porém...


Porém, uma coisa é se passar um conhecimento adiante informalmente, outra coisa é se estar oficialmente habilitado a fazê-lo.  E aí chegamos aos professores de música, danças e etiquetas oficialmente nomeados para esse fim e que foram chamados ao Brasil a mando do príncipe-regente dom João VI, que aqui se instalara com a Corte Portuguesa, evitando que Portugal e colônias ficassem sob domínio de Napoleão. 

Podemos, então, afirmar que a trajetória da dança social no Brasil provavelmente começou com a chegada da Família Real Portuguesa ao país.  Sabe-se que príncipes e jovens nobres tinham professores de música e dança, como parte de sua educação.  Além disso, dom João VI mantinha uma orquestra permanente e uma cia de ballet - e todo o staff necessário a essa manutenção (copistas, produtores, costureiras, ensaiadores, afinadores de instrumentos, etc).  Uma vez instalado no Brasil, o príncipe-regente ordenou a vinda de Pedro Colonna, maestro de dança responsável pelos espetáculos na Capela Real, o que aconteceu em 1810.  Para ministrar aulas de música aos filhos e compor músicas para a Capela Real, dom João mandou vir o mestre de música Marcos Portugal, que também passou a supervisionar e dirigir os teatros públicos.  Marcos Portugal veio acompanhado da esposa, cunhada e sobrinhos... e do dançarino e coreógrafo Luiz Lacomba, com a esposa.

O grupo chegou ao Rio em 11-06-1811 e, já em 13-07-1811, Lacomba fez publicar o anúncio histórico da Gazeta do Rio de Janeiro, onde se lia:
   "Aviso: Luiz Lacomba, professor de dança, ultimamente chegado ao Rio de Janeiro, tem a honra de anunciar a todas as pessoas civilizadas desta cidade que ele se propõe ensinar todas as qualidades de danças próprias nas sociedades: todas as pessoas que lhe quiserem fazer a honra de tomar as suas lições o poderão procurar na rua do Ouvidor, 82, 3º andar."

Considerando-se que Luiz Lacomba era professor oficialmente nomeado para ministrar aulas de dança e considerando-se que até então essas aulas eram restritas à nobreza, pode-se afirmar que as primeiras aulas de danças de salão, dirigidas ao público em geral ("a todas as pessoas civilizadas desta cidade"), foram ministradas por Luiz Lacomba, em julho de 1811.  Estamos, portanto, a menos de um ano do bicentenário da dança de salão no Brasil!

Pode-se imaginar o rebuliço que foi a chegada de rainha, príncipes, princesas, e toda uma casta de nobres ao Rio de Janeiro.  E quantos saraus e bailes não teriam sido realizados para homenageá-los.  Pode-se também imaginar a quantidade de abonados interessados em se preparar para essas ocasiões.  O número de pessoas agendando aulas de dança foi tão grande que Lacomba teve que mandar vir o irmão Lourenço e demais membros da família, para ajudá-lo na empreitada!

Na Corte, Lacomba tornou-se Compositor de Danças da Casa Real e Maestro de Danças da Casa Real, sendo o coreógrafo do primeiro espetáculo de ballet de que se tem notícias no Brasil.  Chamava-se I Due Rivali e foi encenado com a ópera de Marcos Portugal, Oro Non Compra Amore, no Teatro Régio.  Mesmo com o retorno da Corte a Portugal, os Lacomba nunca mais deixaram o país.  Pode-se imaginar porquê.
  • Clique AQUI para ler mais um pouco sobre a história da dança, e veja ao final da postagens alguns links utilizados nas pesquisas sobre esse tema.
  • Clique no marcador "Um pouco de história" para ler mais postagens feitas aqui sobre história da dança e personagens da nossa história.
  • Clique no marcador "200 anos de dança de salão no Brasil", ao final desta postagem, para acompanhar a série de reportagens que publicaremos a respeito, dentro da campanha que o Jornal Falando de Dança está lançando: "Rumo aos duzentos anos".  Recorte e guarde o selo abaixo que será publicado mensalmente no Jornal Falando de Dança até julho de 2011, e concorra a prêmios que serão sorteados na comemoração dos duzentos anos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Personagens da nossa história: Mário Jorge, o Rei dos Salões

Mário Jorge, o Rei dos Salões Ele foi um dos maiores dançarinos – se não o maior – de nossos salões. Isto dito por inúmeras testemunhas que o viram criar nas pistas movimentos hoje incorporados definitivamente aos ritmos dançados a dois. Um trágico acidente o retirou das pistas e ele virou lenda. Décadas mais tarde, ao ser homenageado em um evento, eis que ele encontra a mulher da sua vida, que o ajudaria em sua reabilitação e o colocaria novamente sob as luzes dos holofotes. Estamos falando de MÁRIO JORGE MESSIAS MATOS, o “rei dos salões”, como era chamado nos anos sessenta, que recentemente oficializou sua união com D. Íris Neira, queridíssima administradora da Academia Carlos Bolacha. Foi o casamento mais comentado dos últimos tempos (foto abaixo). “Nem provei do buffet, pois não paravam de nos fotografar”, comentou Íris. . Empenhada em pesquisar e divulgar a história do marido (“muitas fotos se perderam e, dos filmes, só consegui recuperar dois, que precisam ser restaurados”), Íris

Um pouco de história

Madame Poças Leitão Por Carla Salvagni* Louise Frida Reynold Poças Leitão é o nome completo de Madame Poças Leitão, que chegou em São Paulo em 1914, deixando Lousanne, na Suiça. Logo percebeu que os jovens das famílias mais abastadas necessitavam urgentemente de noções básicas de etiqueta. Fundou então a aristocrática “Escola de Dança de Salão e Boas Maneiras”**, em São Paulo. A dança de salão estava incluída no conhecimento básico de etiqueta, era indispensável na vida social requintada. Madame Poças Leitão representou a primeira (senão única) e mais importante escola de dança de salão nas classes altas, em contraste com inúmeros professores que atuavam principalmente na periferia de São Paulo e Rio de Janeiro, vários associados às casas de prostituição e/ou bailes populares (mas isso já é outra história, que oportunamente trataremos). Assim, graças a essa divisão por classe econômica e nível social do início do século, até hoje define-se duas linhas básicas de trabalho e duas his

Roteiro das Bandas: Conjunto Aeroporto

CONJUNTO AEROPORTO (Inf. 2280-2356/9994-5580 Sr José ) clique aqui para ver a coleção do Falando de Dança, de vídeos do conjunto Aeroporto AGENDA: veja no link "Roteiro das bandas e dj's patrocinadores" ****************************************************************